Recentemente aqui em minha cidade houve um seminário no CDDH
(Centro de Defesa dos Direitos Humanos) fundado pelo Leonardo Boff. Se chamou
"Fé e Politica", não participei, claro que portanto não posso
discutir o conteúdo, nem criticar pessoas ou qualquer coisa do tipo, mas posso
falar do que o titulo me faz pensar.
Fé e Política
Combinação curiosa
Na chamada por um email aberto e publico (por isso aqui
compartilho) o pequeno trecho me desafia:
>De acordo com Leonardo Boff, presidente do CDDH, a Fé e
a Política caminham juntas na vida de cada indivíduo. “A fé diretamente tem a
ver com Deus e seu desígnio sobre a humanidade. Mas ela está dentro da
sociedade e é uma das criadoras de opinião e decisão... Pela roda da política a
fé se expressa pela prática da justiça, da solidariedade, da denúncia da
corrupção”.<
São belas palavras, que no meu ver escondem uma
complexidade.
"Deus e seu desígnio sobre a humanidade"
Esse Deus mitológico, em nome do qual sobre o qual muita
crueldade já foi feita por aqueles que sabem seu desígnio. Essa fé robusta
complicada e séria, que em nenhum momento revela o ponto de sua própria
construção e desconstrução. Só os teólogos conhecem realmente sua montagem, e estes
mesmos se perdem em seus meandros. Não é um Deus ou uma Fé que oferecem em
nenhum momento a liberdade real, que seria a libertação desse Deus imaginário
por uma espiritualidade para além de toda forma e conteúdo, nem de uma Fé que
ao final se torna desnecessária por um viver inteiro.
Converter essa política em Fé, ou os seus Faraózinhos em
mito é a consequência natural dessa mistura. A afirmação é totalmente
verdadeira, de que a Fé "está dentro da sociedade e é uma das criadoras de
opinião e decisão..." Entretanto o lidar com isso, fazendo a política o
veiculo da fé (e de uma só correta e justa) dirigida por aqueles que conhecem
os Desígnios, ou faze-la a praça aonde elaboramos as nossas "fés",
burilamos nossas opiniões e desvelamos/criamos/entendemos nosso desígnio e
potencialidade sempre em fluxo e em liberdade, em liberdade até daquilo que
cremos. Por que a vida é mais real que nossos fantasmas, egos e ideias.
Por isso acho o mix do tema do seminário uma daquelas
racionalizações perigosas, esse entendimento dos meandros das almas e das
paixões, de sua estrutura profunda aonde o mito rege e anima, misturada com um
pragmatismo de quem crê que pode adivinhar o caminho por que conhece o desígnio, é um perigo. Tenho certeza que desde Rasputin ou Richelieu, todos os
Conseglieri, até o Projeto Manhattan ou o Foro de São Paulo, todos são cheios
de boas intenções. Mas a Psicologia que liberta também serve pra manipular, o
marketing que vende o sabão melhor vende tiriricas pra plantar em nosso Jardim,
e a Fé serve de alavanca, assim como o Mito de justificativa para atos acima da
lei dos homens...
Fé e Política.... Acho que não!
Por que fé não é aquilo em que se crê, antes é a capacidade
de crer em algo, e acrescentaria, a capacidade de se maravilhar e de
compartilhar em inocência a descoberta e criação do mundo. Essa capacidade de
crer, de entender, sustenta a capacidade de se dar um testemunho pessoal, e não
necessariamente um consensual. Assim como Esperança não é o esperar alguma
coisa, mas um entendimento do processo positivo do viver e de seu desenrolar
compassivo para aqueles que se entregam ao seu fluxo.
Aprisionar a Fé (no meu entender - a capacidade de crer em
algo e infundir esse algo de significado e vitalidade humana) congelando-a no
conteúdo (o objeto – aquilo em que se cre), homogeneizar a Fé (todos devem crer
nesse objeto de Fé – por mais elaborado e diáfano que seja como conceito) é
aprisionar homens e suas energias, é homogeneizar o que é heterogêneo.
Obviamente vou falar aqui abaixo de um mito, o símbolo da
coisa virada do avesso, a questão é que na casa de espelhos, na câmara escura,
que é a psicologia humana as coisas podem virar assim de ponta cabeça.
O Anticristo, e para este existem várias opções (já esta
aqui, nunca existirá, está chegando, é um mito, é real) é produto direto da fé
homogeneizante. É o "Salvador" do universo paralelo, (do universo de
paralelos que não se encontram) apocalíptico, finalista, dividido que se tornou
o nosso. Profetizado por aqueles que viram nos mundos prováveis desde um
passado até nosso agora, a forte tendência e real consequência de um pensar que
separa a humanidade, agora tecnologicamente empoderada, ansiosamente acelerada,
atômica, entre escolhidos e não escolhidos, entre fieis e pecadores. O
Anticristo nem precisa encarnar, e já terá a seu serviço os maiores fieis, as
carolas mais dedicadas, as rezadeiras mais fervorosas, todos os maiores
apologistas da fé em (algo ou alguém) terá a seu serviço esquerdas e as direitas
em igual medida na criação do não futuro.
Não, Fé e Política não funcionam...
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